segunda-feira, 12 de agosto de 2019

A PSICANÁLISE FRENTE AS NOVAS FORMAS DE FILIAÇÃO

Adriana C Mendes

Diante do exposto estudo, referente às questões edípicas, e a partir de uma breve análise das mudanças ocorridas nas configurações familiares, percebe-se que estes novos arranjos causam certo desconforto social, pois implicam na desconstrução de alguns conceitos tidos como verdadeiros até então. Essas inquietações como traz Cecarelli (2007), também surgem dentro dos estudos psicanalíticos. Alguns autores temem que crianças criadas no sistema monoparental ou homoparental teriam seus processos psíquicos fundamentais comprometidos, o que prejudicaria o acesso ao simbólico e à lei. Para outros, as novas formas de procriação e adoção traduziria certa onipotência narcísica, colocando a criança no lugar de objeto encobridor da castração. Outros ainda sustentam que a presença do par homem/mulher na passagem edípica seria indispensável. Corrobora-se com as ideias de Cecarelli (2007) acerca da inscrição do bebê na cultura. Tal inscrição não depende de um arranjo familiar específico, mas sim, de como na posição do Outro, uma determinada organização familiar sustentará esse bebê, assegurando-lhe a “sobrevivência psíquica”. As novas formas de filiação, resultantes tanto das novas práticas sociais no campo da família como também nas novas práticas médicas no campo da reprodução, levantam questões acerca dos estatutos do sujeito e da filiação. São vistas na atualidade formas inéditas de famílias e possibilidades de procriação até então impensáveis, que afetam o sistema simbólico que orienta os sujeitos na cultura. A separação entre sexos e reprodução e as novas possibilidades de maternidades e paternidades são abordadas e discutidas pela Psicanálise sob divergentes posições. Diante desse antagonismo, é requerida, por um lado, como um instrumento de salvação do “pai” e da “família, para controlar as pulsões, impor limites ao indivíduo na considerada “crise” do ocidente. Do outro, ela é convocada para assegurar o discurso do desejo do sexual, rompendo paradigmas e entraves historicamente estabelecidos. “Ou bem se deseja que os psicanalistas ajudem a incriminar o inconsciente, diabolizado sobe sua forma científica; ou bem que liberem cada um dos entraves representados pelas convocações históricas de família (patriarcal)” (TORT,2001, p.16). Tort não adota nenhuma das posições citadas. Ele critica as duas, privilegiando o questionamento de como a Psicanálise se posiciona frente às novas configurações parentais, enfatizando a necessidade de reconsiderar e redefinir certezas fundamentais da teoria psicanalítica. O autor trata com prudência essa questão para evitar generalizações sobre os possíveis efeitos psíquicos de um sujeito fruto de procriação artificial. As leis de filiação impõem limites e ordenam os sujeitos. São a referência, fundamental na estruturação psíquica e na inscrição do indivíduo como sujeito desejante. O psicanalista acentua a importância do nome e da genealogia como norteadores do sujeito na cultura, situando-o numa ordem, garantido a ele um lugar, uma identidade. A transmissão do sobrenome do pai está submetida á uma montagem jurídica. Os avanços da ciência e da tecnologia nos indicam a necessidade de se reconsiderar os fundamentos teóricos e conceituais da Psicanálise, uma vez que ela trata da relação do homem e seus desejos com a cultura. Como aduz Joel Birman, “esta deve ser permanentemente remodelada em consequênciados processos de transformação contínua da ordem social, que se realizam de maneira intensiva e extensiva” (BIRMAN, 2005, p.79). Frentea estes avanços, a Psicanálise, dentro de um discurso ético, pode pensar os efeitos que estas questões geram nas representações inconscientes de cada sujeito e na ordem simbólica da filiação.


quarta-feira, 7 de agosto de 2019

ARMADILHAS DA MENTE

Eliani Gracez
Uma das armadilhas da mente é quando a pessoa, ao desenvolver um trabalho, tem por finalidade receber elogio, tanto na vida pessoal quanto na vida profissional. Pessoas seguras de si amam o que fazem e não precisam do elogio, elas sabem a priori que deram o seu máximo. Aliás, as pessoas sempre dão o seu máximo, mas é preciso lembrar que o máximo de um não é máximo do outro. Isso não quer dizer que não se deva receber ou fazer elogios, apenas que o elogio não pode ser a motivação.
Outra armadilha da mente é quando a pessoa não aceita a crítica. A crítica é o ponto de vista do outro, é como o outro vê o nosso trabalho, e por isso deve ser acolhida, isso não quer dizer que devemos mudar todo um trabalho por causa de uma crítica. Mas sim receber bem a crítica de um colega, de um chefe ou de um familiar.
Não querer ser infeliz ou querer sempre ser feliz. Freud, o pai da psicanálise dizia que procuramos o prazer para não ter desprazer. Queremos sempre o prazer em tudo. E assim buscamos mais e mais prazer, isso é uma armadilha, não dá para viver só de prazer, a vida é composta de prazer e de desprazer. A questão é como lidamos com o desprazer.
Alguns lidam com a crítica como sendo um desprazer, com desconforto. Mas aquele que sabe lidar com imparcialidade ao receber uma crítica, sem se deixar afetar com uma crítica muitas vezes destrutiva, essa pessoa tem sabedoria, pois sabe que a vida não é feita só de prazer ou felicidade e nem só de desprazer ou infelicidade.
Outra armadilha da mente é quando a pessoa não quer ser ignorada, trata-se daquela pessoa que gosta de chamar a atenção. Pessoas assim têm por meta chamar a atenção, seja por carência emocional, soberba ou por tantos outros motivos. Pessoas assim esquecem-se do profissionalismo. Isso é uma armadilha da mente que impede a felicidade e geradora de conflitos no ambiente de trabalho.
 Antídotos que pessoas com sabedoria usam: Amor pelo trabalho, paciência, tranquilidade, empatia. Esses são alguns antídotos que acabam com a raiva, ódio, ciúmes, inveja, orgulho, entre outros tantos. Antídotos que são usados na administração de conflitos.



O ADOECER E A REORGANIZAÇÃO DA PSIQUE

Eliani Gracez

O adoecer e a reorganização da psique tornaram-se uma possibilidade terapêutica que encoraja o analisando a superar seus conflitos, entre a pulsão e a saúde psíquica, ao trazer a luz os impulsos inconscientes reprimidos ou recalcados. O adoecer do neurótico está vinculado a uma situação patológica de frustração das pulsões e repressão da libido, sendo assim, o adoecer é consequência e não a causa de um transtorno patológico. Causas prováveis de neurose são, em geral, rigidez moral que causam recalque na infância, frustrações, falta de amor, desestrutura familiar, rigidez ética imposta pela sociedade. A repressão e mecanismos coercitivos da sociedade são fomentadores de conflitos, por exemplo, a libido versus ideal acético. E assim se instala uma luta entre dois impulsos gerando a doença ou neurose. Não vamos aqui confundir a luta entre duas polaridades que acontece na hora em que o indivíduo tem que fazer uma escolha, mas sim entre o ego e aquilo que muitas vezes ficou recalcado no inconsciente, uma verdadeira luta entre a doença e sua causa. A luta só pode ser vencida quando os dois oponentes se encontram em campo de batalha, onde um pode ver o outro, a luta acontece no consciente. E assim a neurose e sua causa se encontram para a solução do conflito instalado. Desse confronto surge de alguma forma uma solução para o neurótico. Uma luta consciente da causa e seu subsequente efeito. 

OBSERVAÇÕES SOBRE O AMOR TRANSFERENCIAL

Adriana C Mendes 

Se o psicanalista clínico indagar a si mesmo qual perturbação leva as pessoas com maior frequência a o procurarem em busca de auxílio, ele será compelido a responder deixando de lado as diversas formas de ansiedade – que consiste na impotência psíquica. Esta singular perturbação atinge homens de natureza intensamente libidinosa e se manifesta como uma recusa dos órgãos executores da sexualidade de levar a cabo o ato sexual, conquanto antes e depois eles possam demonstrar-se como íntegros e capazes de praticá-lo e conquanto apresentem forte propensão psíquica a realizá-lo. A primeira chave para a compreensão do seu estado se obtém do próprio paciente, ao efetuar-se a descoberta de que um malogro dessa espécie só surge quando a tentativa se realiza com determinadas pessoas, enquanto com outras nunca há qualquer cogitação de tal insucesso. Ele se dá conta, então, de que constitui alguma característica do objeto sexual que dá origem à inibição de sua potência masculina e, às vezes, declara que possui a sensação de um obstáculo dentro dele, a sensação de uma vontade contrária que interfere vitoriosamente com a sua intenção consciente. No entanto, é incapaz de se representar que obstáculo interno é esse e que característica do objeto sexual o põe em funcionamento. Se a experiência do malogro se repetiu, é provável que atribua ao processo habitual de `conexão errônea,’ de que a recordação da primeira ocasião evocava a ideia de ansiedade perturbadora, e assim motivava que o malogro se repetisse todas as vezes; conquanto atribua a primeira ocasião em si a alguma impressão ‘fortuita’.

 Os estudos psicanalíticos da impotência já foram realizados e publicados por vários autores. Todo analista pode confirmar as explicações por eles fornecidas, através de sua própria experiência clínica. Trata-se, de fato, de uma questão da influência inibitória de certos complexos psíquicos que são removidos do conhecimento do indivíduo. Uma fixação incestuosa na mãe ou na irmã, que nunca foi superada, desempenha um papel importante nesse material patogênico e constitui o seu conteúdo mais universal. Além disso, existe a influência, a se considerar, das impressões penosas acidentais relacionadas à atividade sexual infantil, e também aqueles fatores que, de maneira geral, reduzem a libido que se deve dirigir ao objeto sexual feminino.

Quando se investigam, exaustivamente, casos marcantes de impotência psíquica pela psicanálise, obtém-se a seguinte informação sobre os processos psicossexuais ativos nos mesmos. Aqui de novo – como muito provavelmente em todas as perturbações neuróticas – a origem da perturbação é determinada por uma inibição na história do desenvolvimento da libido antes que esta assuma a forma que tomamos como sua terminação normal. Nos casos que estamos considerando, duas correntes cuja união é necessária para assegurar um comportamento amoroso completamente normal, falharam em se combinar. Podem-se distinguir as duas como a corrente afetiva e a corrente sensual.

A corrente afetiva é a mais antiga das duas. Constitui-se nos primeiros anos da infância; forma-se na base dos interesses do instinto de autopreservação e se dirige aos membros da família e aos que cuidam da criança. Desde o início, leva consigo, contribuições dos instintos sexuais – componentes de interesse erótico – que já se podem observar, de maneira mais ou menos clara, mesmo na infância, e que se descobrem de algum modo mais tarde nos neuróticos através da psicanálise. Corresponde à escolha de objeto, imaginário, da criança. Aprendemos, assim, que os instintos sexuais encontram seus primeiros objetos ao se apegarem às apreciações feitas pelos instintos do ego, precisamente no momento em que as primeiras satisfações sexuais são experimentadas em ligação com as funções necessárias à preservação da vida. A ‘afeição’ demonstrada pelos pais da criança e pelos que dela cuidam, que raramente deixa de delatar sua natureza erótica (a criança é um brinquedo erótico), concorre, em grande parte, para erigir as contribuições feitas pelo erotismo  de seus instintos do ego e para incrementá-la numa medida em que se compele a desempenhar um papel em seu desenvolvimento ulterior, principalmente quando algumas outras circunstâncias emprestam seu suporte.

Essas fixações afetivas da criança persistem por toda a infância e continuamente conduzem consigo o erotismo, que, em consequências, se desvia de seus objetivos sexuais. Então, com a puberdade, elas se unem através da poderosa corrente ‘sensual’, a qual já não se equivoca mais em seus objetivos. Evidentemente, jamais deixa de seguir os mais primitivos caminhos e catexizar os objetos da escolha infantil primária com cotas de libido, que são agora muito mais poderosas. Neste ponto, no entanto, defronta-se com obstáculos que, nesse meio tempo, foram erigidos pela barreira contra o incesto; em consequência, se esforçará por transpor esses objetos que são, na realidade, inadequados, e encontrar um caminho, tão breve quanto possível, para outros objetos estranhos com os quais se possa levar uma verdadeira vida sexual. Esses novos objetos ainda serão escolhidos ao modelo (imago) dos objetos infantis, mas com o correr do tempo, atrairão para si a afeição que se ligava aos mais primitivos. Um homem deixará seu pai e sua mãe – segundo o preceito bíblico – e se apegará à sua mulher; então, se associam afeição e sensualidade. O máximo de intensidade de paixão sensual trará consigo a mais alta valorização psíquica do objeto – sendo esta a supervalorização normal do objeto sexual por parte do homem.

Dois fatores decidirão se esse avanço no caminho do desenvolvimento da libido pode falhar. Em primeiro lugar, há a quantidade de frustração da realidade que se opõe à nova escolha de objeto e reduz seu valor para a pessoa em questão. Afinal não há qualquer sentido em decidir-se por uma escolha de objeto se nenhuma escolha será de todo permitida ou se não há nenhuma perspectiva de ser capaz de escolher alguma coisa adequada. Em segundo lugar, há a quantidade de atração que são capazes de exercer os objetos infantis, que deverão ser abandonados, e que existe em proporção às catexias eróticas que se ligam a eles na infância. Se esses dois fatores forem suficientemente fortes, o mecanismo geral, por meio do qual se estruturam as neuroses, entra em funcionamento. A libido afasta-se da realidade, é substituída pela atividade imaginativa (o processo de introversão), fortalece as imagens dos primeiros objetos sexuais e se fixa nos mesmos. O obstáculo erguido contra o incesto, entretanto, compele a libido, que se transferiu para esses objetos, a permanecer no inconsciente. A atividade masturbatória levada a efeito pela corrente sensual, que agora é parte do inconsciente, faz sua própria contribuição, ao fortalecer essa fixação. Nada se altera nesse estado de coisas, se o avanço, que é abortado na realidade, se completa agora na fantasia e nas situação que levam à satisfação em masturbar os objetos sexuais originais são substituídos por objetos diferentes. Em consequência dessa substituição, as fantasias se tornam admissíveis à consciência, mas não se faz qualquer progresso na localização da libido na realidade. Deste modo, pode acontecer que a totalidade da sensualidade de um jovem se ligue a objetos incestuosos no inconsciente, ou para colocar em outras palavras, se fixe em fantasias incestuosas inconscientes. O resultado, então, é a impotência total que, talvez, mais tarde se reforce pelo início simultâneo de um real debilitamento dos órgãos que realizam o ato sexual.

Necessita-se de condições menos graves para dar origem ao estado conhecido especificamente como impotência psíquica. Neste caso, o destino da corrente sensual não deve ser o de que sua carga total tenha de se ocultar atrás da corrente afetiva; ela deve ter permanecido suficientemente forte ou desinibida para assegurar vazão parcial à realidade. A atividade sexual dessas pessoas apresenta sinais muito evidentes, entretanto, de que não possui a força impulsiva psíquica total do instinto por trás dela. É caprichosa, facilmente perturbada, muitas vezes não propriamente executada e não acompanhada de muito prazer. Mas, acima de tudo, é forçada a evitar a corrente afetiva. A restrição, assim, se colocou na escolha do objeto. A corrente sensual, que permaneceu ativa, procura apenas objetos que não rememorem as imagens incestuosas que lhe são proibidas; se alguém causa uma impressão que pode levar à sua alta estima psíquica, essa impressão não encontra escoamento em nenhuma excitação sensual, exceto na afeição que não possui efeito erótico. Toda a esfera do amor, nessas pessoas, permanece dividida em duas direções personificadas na arte do amar tanto sagrada como profana (ou animal). Quando amam, não desejam, e quando desejam, não podem amar. Procuram objetos que não precisem amar, de modo a manter sua sensualidade afastada dos objetos que amam; e, de acordo com as leis da ‘sensibilidade complexiva’ e do retorno do reprimido, o estranho malogro, demonstrado na impotência psíquica, faz seu aparecimento sempre que um objeto, que foi escolhido com a finalidade de evitar o incesto, relembra o objeto proibido através de alguma característica, frequentemente imperceptível.

A principal medida protetora contra essa perturbação a que os homens recorrem nessa divisão de seu amor consiste na depreciação do objeto sexual, sendo reservada a supervalorização, que normalmente se liga ao objeto sexual para o objeto incestuoso e seus representantes. Logo que se consuma a condição de depreciação, a sensualidade pode se expressar livremente e podem se desenvolver importantes capacidades sexuais e alto grau de prazer. Há outro fator que contribui para esta consequência. As pessoas nas quais não houve a confluência apropriada das corrente afetiva e sensual geralmente não demonstram muito refinamento nas suas formas de comportamento amoroso; elas retiveram suas finalidades sexuais perversas, cuja não-realização é sentida como uma grave perda de prazer e cuja realização, por outro lado, só parece possível com um objeto sexual depreciado e desprezado.

Podemos agora compreender os motivos ocultos sob as fantasias do menino, mencionadas na primeira dessas Contribuições, que degradam a mãe ao nível de uma prostituta. São esforços para transpor a distância entre as duas correntes amorosas, pelo menos em fantasia e, pela depreciação da mãe, adquiri-la como objeto de sensualidade.

No capítulo anterior, abordamos o estudo da impotência psíquica do ângulo médico-psicológico, ao qual o título deste trabalho não faz alusão. Tornar-se-á evidente, no entanto, que esta introdução foi requerida para proporcionar acesso a nosso tema propriamente dito.

Reduzimos a impotência psíquica à falha em se combinar as correntes afetivas e sensuais no amor e se explicou essa inibição do desenvolvimento, por sua vez, como se devendo a influências de poderosas fixações infantis e da subsequente frustração da realidade através da intervenção da barreira contra o incesto. Há uma objeção principal à teoria que desenvolvemos: oferece demasiado. Explica por que certas pessoas padecem de impotência psíquica, mas nos deixa frente ao mistério aparente de como outras foram capazes de escapar a essa perturbação. Visto que devemos reconhecer que todos os fatores relevantes que conhecemos – a forte fixação infantil, a barreira ao incesto e a frustração nos anos de desenvolvimento depois da puberdade – podem ser encontrados em praticamente todos os seres humanos civilizados, deve-se justificar a perspectiva da impotência psíquica como uma condição universal da civilização e não uma perturbação circunscrita a alguns indivíduos.

Seria fácil fugir a esta conclusão apontando para o fator quantitativo na motivação da doença – para o maior ou menor grau da contribuição feita pelos vários elementos que determinam se resulta ou não uma enfermidade reconhecível. Conquanto, porém, eu aceite esta resposta como correta, não é minha intenção transformá-la no motivo para rejeitar a própria conclusão. Ao contrário, apresentarei o conceito de que a impotência psíquica está muito mais difundida do que se supõe e que certa extensão desse comportamento caracteriza, de fato, o amor do homem civilizado.

Se ampliar o conceito da impotência psíquica e não se restringir o malogro em realizar o ato do coito, em circunstâncias em que esteja presente o desejo de obter prazer e o aparelho genital esteja intacto, podemos, em primeiro lugar, acrescentar todos aqueles homens que são descritos como psicanestésicos: homens que nunca falham no ato, mas que o realizam sem dele derivar qualquer prazer especial – um estado de coisas que é muito mais comum do que se pensa. O exame psicanalítico desses casos revela os mesmos fatores etiológicos encontrados na impotência psíquica no seu sentido mais estrito, sem antes encontrar qualquer explicação para a diferença entre seus sintomas. Uma analogia facilmente justificável nos leva desses homens anestésicos para o imenso número de mulheres frígidas; e não há melhor maneira de descrever ou compreender seu comportamento amoroso do que comparando-o à perturbação manifesta da impotência psíquica nos homens.

Se, no entanto, voltarmos nossa atenção, não para a extensão do conceito de impotência psíquica mas para as gradações em sua sintomatologia, não poderemos fugir à conclusão de que o comportamento amoroso dos homens, no mundo civilizado de hoje, de modo geral traz o selo da impotência psíquica. Existe apenas um pequeno número de pessoas educadas em que as duas correntes, de afeição e de sensualidade, se fundiram adequadamente; o homem quase sempre sente respeito pela mulher, que atua como restrição à sua atividade sexual, e só desenvolve potência completa quando se acha com um objeto sexual depreciado; e isto, por sua vez, é causado, em parte, pela entrada de componentes perversos em seus objetivos sexuais, os quais não ousa satisfazer com a mulher que ele respeita. Assegura-se de prazer sexual completo apenas quando se pode dedicar sem reserva a obter satisfação, o que, com sua mulher bem educada, por exemplo, não se atreve a realizar. É esta a origem de sua necessidade de um objeto sexual depreciado, de uma mulher eticamente inferior, a quem não precise atribuir escrúpulos estéticos, que não o conheça em seu outro círculo de relações sociais e que ali não o possa julgar. É a esta mulher que prefere dedicar sua potência sexual, mesmo quando toda sua afeição pertença a uma mulher de natureza superior. Também é possível que a tendência a escolher uma mulher de classe mais baixa para sua amante permanente ou mesmo para sua esposa, tão frequentemente observada nos homens das classes mais altas da sociedade, nada mais seja que a consequência de sua necessidade de um objeto sexual depreciado, a quem se vincule psicologicamente a possibilidade de completa satisfação sexual.

Não vacilo em admitir que os dois fatores em atividade na impotência psíquica, no sentido estrito – os fatores de intensa fixação incestuosa, na infância, e a frustração devida à realidade, na adolescência – respondam também por esta característica extremamente comum do amor dos homens civilizados. Parece não só desagradável mas também paradoxal, que deva, não obstante, afirmar que alguém, para ser realmente livre e feliz no amor, tem de sobrepujar seu respeito pelas mulheres e aceitar a ideia do incesto com sua mãe ou irmã. Qualquer pessoa que se sujeite a uma séria introspecção a respeito dessa necessidade certamente se convencerá ao descobrir que considera o ato sexual, basicamente, algo degradante, que conspurca e polui mais do que simplesmente o corpo. A origem dessa vil opinião, que ele certamente não reconhecerá de boa-vontade, deve ser procurada no período de sua infância em que a corrente sensual nele existente já estava grandemente desenvolvida, mas sua satisfação com um objeto fora da família era quase tão absolutamente proibida como o era com um objeto incestuoso.

No nosso mundo civilizado, as mulheres estão sob a influência de um efeito residual, semelhante, de sua educação e, além disso, de sua reação ao comportamento dos homens. É, naturalmente, tão desvantajoso para uma mulher se um homem a procura sem sua potência plena como o é se a supervalorização inicial dela, quando enamorado, dá lugar a uma sub valorização depois de possuí-la. No caso das mulheres, há pouca indicação da necessidade de depreciar seu objeto sexual. Isto se liga, sem dúvida, com a ausência nelas, geralmente, de nada semelhante à supervalorização que se encontra nos homens. Porém, sua longa contenção de sexualidade e seu anseio de sensualidade em fantasia, tem para elas outra consequência importante. São, muitas vezes, sub sequentemente, incapazes de desfazer a conexão entre a atividade sensual e a proibição, tornando-se psiquicamente impotentes, isto é, frígidas, quando tal atividade, finalmente, lhes é permitida. Esta é a origem do empenho realizado por muitas mulheres de manter secretas, por certo tempo, mesmo suas relações legítimas; e da capacidade de outras mulheres para a sensação normal, tão logo a condição de proibição se restabeleça devido a uma relação amorosa secreta: infiéis a seus maridos, são capazes de manter um segunda espécie de finalidade em relação a seus amantes.

A condição de proibitividade na vida erótica das mulheres é comparável, creio eu, à necessidade da parte dos homens de depreciar seu objeto sexual. Ambas são consequências de um longo período de demora, que é exigida pela educação, por razões culturais, entre a maturidade sexual e a atividade sexual. Ambas tendem a abolir a impotência psíquica que resulta do malogro de se fundirem os impulsos afetuosos e sensuais. O fato de que o efeito das mesmas causas seja tão diferente nos homens e nas mulheres pode talvez ser atribuído a outra diferença no comportamento dos dois sexos. As mulheres civilizadas geralmente não transgridem a proibição de atividade sexual durante o período em que têm de esperar e, assim, estabelecem a ligação íntima entre proibição e sexualidade. Os homens geralmente desrespeitam essa proibição se podem satisfazer a condição de depreciar o objeto e, em consequência, mantêm essa condição em seu amor mais tarde, na vida.

Em vista dos esforços extenuantes que se fazem hoje, no mundo civilizado, para reformar a vida sexual, será supérfluo advertir que a pesquisa psicanalítica está tão isenta de tendenciosidade quanto qualquer outra espécie de pesquisa. Não há nenhum outro objetivo em vista além de derramar alguma luz sobre as coisas, ao procurar que se revele o que está oculto. Será bastante satisfatório se as reformas fizerem uso dessas descobertas para substituir o que é prejudicial por algo mais vantajoso; mas não se pode predizer se outras instituições não redundarão em outros sacrifícios, talvez mais sérios.

O fato de que a restrição feita ao amor pela civilização envolva uma tendência universal a depreciar os objetos sexuais pode conduzir-nos, talvez, a desviar nossa atenção do objeto para os instintos em si. O prejuízo causado pela frustração inicial do prazer sexual se evidencia no fato de que a liberdade mais tarde concedida a esse prazer, no casamento, não proporcione satisfação completa. Mas, ao mesmo tempo, se não se limita a liberdade sexual desde o início, o resultado não é melhor. Pode-se verificar, facilmente, que o valor psíquico das necessidades eróticas se reduz, tão logo se tornem fáceis suas satisfações. Para intensificar a libido, se requer um obstáculo; e onde as resistências naturais à satisfação não foram suficientes, o homem sempre ergueu outros, convencionais, a fim de poder gozar o amor. Isto se aplica tanto aos indivíduos como às nações. Nas épocas em que não havia dificuldades que impedissem a satisfação sexual, como, talvez, durante o declínio das antigas civilizações, o amor tornava-se sem valor e a vida, vazia; eram necessárias poderosas formações reativas para restaurar os valores afetivos indispensáveis. Nessa conexão, pode-se afirmar que a corrente ascética da Cristandade criou valores psíquicos para o amor que a antiguidade pagã nunca fora capaz de lhe conferir. Essa corrente adquiriu sua maior importância através dos monges ascéticos, cujas vidas foram quase exclusivamente dedicadas a combater a tentação libidinosa.

Nosso primeiro impulso consiste, sem dúvida, em retraçar as dificuldades aqui reveladas às características universais de nossos instintos orgânicos. Por certo também é verdade que, em geral, a importância psíquica de um instinto cresce em proporção a sua frustração. Suponhamos que uma série de pessoas, totalmente diferentes, fossem todas igualmente sujeitas à fome. À medida que sua necessidade imperiosa de alimentos crescesse, todas as diferenças individuais desapareceriam e, em seu lugar, observar-se-iam manifestações uniformes do único instinto não saciado. Mas, será também verdade que, com a satisfação de um instinto, seu valor psíquico sempre cai na mesma proporção? Consideremos, por exemplo, a relação de um beberrão com o vinho. Não é verdade que o vinho sempre proporciona ao beberrão a mesma satisfação tóxica que, na poesia, tem sido tão frequentemente comparada à satisfação erótica – uma comparação que também é igualmente aceitável do ponto de vista científico? Alguém já ouviu falar de que o beberrão seja obrigado a trocar constantemente de bebida, porque logo enjoa de beber a mesma coisa? Ao contrário, o hábito constantemente reforça o vínculo que prende o homem à espécie de vinho que ele bebe. Alguém já ouviu falar de um beberrão que precise ir a um país em que o vinho seja mais caro ou em que seja proibido beber, de modo que, erguendo obstáculos, ele possa aumentar a satisfação decrescente que obtém? De maneira nenhuma. Se atentarmos para o que dizem os grandes alcoólatras, como Böcklin, a respeito de sua relação com o vinho, ela aparece como a mais harmoniosa possível, um modelo de casamento feliz. Por que a relação do amante com seu objeto sexual será tão profundamente diferente?

Por mais estranho que pareça, creio que devemos levar em consideração a possibilidade de que algo semelhante na natureza do próprio instinto sexual é desfavorável à realização da satisfação completa. Se considerarmos a longa e difícil história do desenvolvimento do instinto, nos virão à mente, imediatamente, dois fatores que podem ser julgados os responsáveis por essa dificuldade. Primeiramente, em consequência da irrupção bifásica da escolha de objeto, e da interposição da barreira contra o incesto, o objeto final do instinto sexual nunca mais será o objeto original, mas apenas um sub-rogado do mesmo. A psicanálise revelou-nos que quando o objeto original de um impulso desejoso se perde em consequência da repressão, ele se representa, frequentemente, por uma sucessão infindável de objetos substitutos, nenhum dos quais, no entanto, proporciona satisfação completa. Isto pode explicar a inconstância na escolha de objetos, o ‘anseio pela estimulação’ que tão amiúde caracterizam o amor dos adultos.

Em segundo lugar, sabemos que o instinto sexual é, originalmente, dividido em grande número de componentes – ou melhor, desenvolve-se desses componentes – alguns dos quais não podem integrar o instinto em sua forma final, mas têm de ser suprimidos ou destinados a outros empregos em uma fase anterior. São eles, principalmente, os componentes instintivos, que demonstraram ser incompatíveis com nossos padrões estéticos de cultura, provavelmente porque, em consequência de havermos adotado a postura ereta, erguemos do chão nosso órgão do olfato. O mesmo se aplica a uma grande parte dos impulsos sádicos que constituem parte da vida erótica. Mas todos esses processos do desenvolvimento só atingem as camadas mais superiores de estrutura complexa. Os processos fundamentais que produzem excitação erótica permanecem inalterados. O excrementício está todo, muito íntima e inseparavelmente, ligado ao sexual; a posição dos órgãos genitais – inter urinas et faeces – permanece sendo o fator decisivo e imutável. Poder-se-ia dizer neste ponto, modificando um dito muito conhecido do grande Napoleão: ‘A anatomia é o destino.’ Os órgãos genitais propriamente ditos não participaram do desenvolvimento do corpo humano visando à beleza: permaneceram animais e, assim, também o amor permaneceu, em essência, tão animal como sempre foi. Os instintos do amor são difíceis de educar; sua educação ora consegue de mais, ora de menos. O que a civilização pretende fazer deles parece inatingível, a não ser à custa de uma ponderável perda de prazer: a persistência dos impulsos que não puderam ser utilizados pode ser percebida na atividade sexual, sob a forma de não-satisfação.

Assim, talvez tenhamos de ser forçados a nos reconciliar com a ideia de que é absolutamente impossível harmonizar os clamores de nosso instinto sexual com as exigências da civilização: de que, em consequência de seu desenvolvimento cultural, a renúncia e o sofrimento, bem como o perigo de extinção no futuro mais remoto, não podem ser evitados pela raça humana. Este sombrio prognóstico repousa, é verdade, na simples conjectura de que a não-satisfação inerente à civilização é consequência necessária de certas peculiaridades que o instinto sexual adotou sob a pressão da cultura. A própria incapacidade do instinto sexual de produzir satisfação completa, tão logo se submete às primeiras exigências da civilização, torna-se a fonte, no entanto, das mais nobres realizações culturais que são determinadas pela sublimação cada vez maior de seus componentes instintivos. Pois, que motivo teria o homem para colocar as forças instintivas sexuais a outros serviços se, com qualquer distribuição dessas forças, eles poderiam conseguir prazer completamente satisfatório? Não renunciariam nunca a esse prazer e jamais realizariam qualquer outro progresso. Parece, portanto, que a diferença irreconciliável entre as exigências dos dois instintos – o sexual e o egoísta – tornou os homens capazes de realizações cada vez melhores, conquanto sujeitos, é verdade, a um perigo constante, ao qual, sob a forma de neurose, sucumbem hoje os mais fracos.

“Os instintos do amor são difíceis de educar; sua educação ora consegue de mais, ora de menos. O que a civilização pretende fazer deles parece inatingível, a não ser à custa de uma ponderável perda de prazer: a persistência dos impulsos que não puderam ser utilizados pode ser percebida na atividade sexual, sob a forma de não-satisfação”

Bibliografia:
Vol. XII – (8) OBSERVAÇÕES SOBRE O AMOR
TRANSFERENCIAL (NOVAS RECOMENDAÇÕES SOBRE A TÉCNICA DA PSICANÁLISE III) (1915 [1914])






segunda-feira, 5 de agosto de 2019

OS INDESEJÁVEIS

Eliani Gracez 

Inspirado em Claudio Mello Wagner, “indesejáveis até que ponto?” A sociedade cria pessoas "indesejáveis" e depois as exclui. O desejo inicial é de que essas pessoas não existissem, por isso, a sociedade finge que elas não existem. Os “indesejáveis” são dependentes químicos, esquizofrênicos, doentes mentais, moradores de rua etc. Ameaçada, a sociedade aumenta a repressão para manter os “indesejáveis” o mais longe possível. Cria-se então a indústria da segurança: grades, alarmes, portaria 24 horas. A sociedade trata como se a solução fosse manter os indesejáveis o mais longe possível. Essa é a saída encontrada pela sociedade. No entanto, saída não é solução. Saída é paliativo, a solução está em deixar de produzir “indesejáveis”, e parar de produzir “indesejáveis” é ir ao mundo do outro para ver o que tem lá, para isso, temos que enfrentar os nossos medos e limites. Temos que enfrentar a falência social e moral. Temos que ir ao vale da morte onde o outro se encontra marginalizado social e culturalmente. Cada sociedade ou organização social produz regras, leis, estatutos, e deseja que seus indivíduos concordem com isso. Aqueles que não se enquadram tornam-se “indesejáveis” e, portanto, um problema social. Assim são eliminados os subversivos ou aqueles que ultrapassam a legalidade. A sociedade trata os “indesejáveis” como se fossem doentes, no entanto, o doente é a sociedade que produz seres humanos que não se enquadram dentro das normas e depois os exclui como se fossem lixo ou coisa descartável. Cada pessoa tem uma singularidade que tem que ser incluída na coletividade. Espera-se uma simbiose perfeita desta união, o problema, nesse caso, está no esperado, visto que nem sempre a singularidade de cada pessoa se enquadra no ideal social. O problema agora é o que fazer com os “indesejáveis”, mas, sobretudo, o que fazer com aqueles que indesejam os indesejáveis. 

A NOVA CONFIGURAÇÃO FAMILIAR

Adriana C Mendes         


           A família sofreu muitas mudanças nos últimos tempos. A tradicional configuração, mãe pai e bebê, já não é mais tão tradicional assim, abrindo espaço a outras organizações como, por exemplo, as família monoparentais casais homossexuais, os agregamentos familiares, entre outros. Tendo em vista todas as mudanças da contemporaneidade, sem dúvida as questões colocadas pelas novas configurações familiares submetem alguns dos pressupostos psicanalíticos mais ortodoxos á  reflexão, nos trazendo a seguinte questão: Qual a influência das novas configurações familiares na internalização dos limites para sujeito?
           A partir dos ensinamentos psicanalíticos freudianos, sabe-se que a família é a estrutura responsável pela inserção da criança na cultura. Freud suas teorizações sobre  a internalização do limite para o sujeito ao formular o conceito referente ao Complexo de Édipo. Segundo ele, o complexo envolve investimentos eróticos e agressivos em relação ás figuras parentais e as persistências destas ligações estariam no centro das neuroses (FREUD,1905).
           É a partir do Édipo Freudiano que Lacan irá construir sua teoria e o conceito de função paterna. De acordo com esse autor, para que o desfecho do complexo seja favorável é necessário que o sujeito possa simbolizar a castração, a frustração e a  privação desempenhada pela metáfora paterna.
           O caráter central do Édipo é que, neste período, o sujeito se dá conta que está excluído de uma relação. Entretanto, nada indica que o caráter triangular deva ocorrer com duas pessoas de sexo diferente. Ao afirmar esta questão, podem-se analisar questões edípicas dentro das novas configurações familiares.
           A partir de um resgate sobre Édipo e a Lei da Castração surge a hipótese de que alguns comportamentos que a sociedade repudia ou que é classificado como falta de limite, pode estar endereçado ao que Lacan denomina de “O Grande Outro” é a busca pelo “Nome- do Pai”, pela Lei.
            O interesse em se pesquisar este assunto surgiu ao observar a frequência de reportagens nos noticiários referente aos jovens infratores em nossa sociedade. Pensando nisso questionou-se sobre o porquê destes jovens estarem apresentando  atos transgressivos cada vez mais violentos. Buscando respostas a estes e outros questionamentos, observou-se que além deste comportamento estar mais visível devido á facilidade da divulgação pela mídia dos acontecimentos, outra questão que aparece com frequência  se refere ás novas  configurações familiares.


O COMPLEXO DE ÉDIPO E A SUPERPROTEÇÃO NA CRIANÇA EDIPIANA

Adriana C Mendes

Já não é novidade o quanto a superproteção pode trazer consequências para o desenvolvimento da criança que pode acompanhá-la por toda a vida. É importante que pai e mãe protejam seus filhos, até mesmo para que eles se sintam amados e protegidos, mas é importante também que saibam quando deixar a “corda mais frouxa”. Pais superprotetores podem impedir que a criança crie independência, e criá-la faz parte de um desenvolvimento sadio. Pensando nisso, qual seria o peso da superproteção durante a fase do Complexo de Édipo? Poderia trazer consequências ainda maiores?
De acordo com a teoria freudiana o CE é introduzido em uma das fases do desenvolvimento psicossexual, a denominada fase fálica, que ocorre aproximadamente dos 3 aos 7 anos de idade. É nessa fase que a criança começa a se interessar pela diferença anatômica do sexo oposto e a sentir prazer na estimulação do pênis ou do clitóris. O prazer começa a deixar de ser auto erótico, a criança passa a fantasiar o contato genital, e por volta dos 5 anos de idade, ela começa a focalizar uma outra pessoa: o progenitor do sexo oposto.
A mãe é o primeiro objeto de amor e identificação tanto para o menino quanto para a menina. Aquela que cuida, protege, alimenta, mas que representa também um poder avassalador. E é nessa fase que a criança se depara com um conflito entre querer continuar tendo essa proteção e criar independência. O pai simboliza o mundo externo, aquele que sai, conhece o mundo e retorna.
Aqui podemos começar a pensar nas consequências que a superproteção e o não estímulo para a independência podem trazer para a vida da criança. Há um conflito muito grande entre continuar sendo protegida e criar independência, se afastando um pouco dessa mãe que protege, mas que também representa poder absoluto e assustador. Penso ser uma fase delicada, que exige atenção e amabilidade dos pais para com a criança, pois ela deseja a independência, mas deseja também continuar sendo protegida. É importante estimulá-la a criar independência e em contrapartida mostrar que ela continuará tendo amor e proteção.
Em meio a esse conflito a criança busca pelo pai, e o pai entra na relação como um neutralizador desse poder. O menino ao buscar pelo pai se identifica (os dois possuem pênis), e se sente acolhido como o camarada do papai. Mas nessa relação há um conflito, o mesmo pai que é amado é visto como um rival do amor da mãe. Em contrapartida, o pai também enxerga o filho como rival (vale lembrar que todo esse processo é inconsciente), pois é aquele que por determinado tempo o fez dividir a atenção e amor da esposa. O que de fato acontece após o nascimento de um filho (a), onde passa a existir mais alguém entre a relação do casal e que no inicio dependerá totalmente de cuidados. Então podemos perceber que o menino conseguiu identificar-se com o pai e tê-lo como neutralizador. Ele ama e ao mesmo tempo vê esse pai como rival, mas o seu objeto de amor edipiano continua sendo a mãe.
No caso da menina o processo se complica um pouco. Ao recorrer ao pai ela se depara com uma grande decepção, ela não se identifica com ele (ela não tem um pênis), e não se sente acolhida como uma camarada, da forma que o menino se sentiu. Mas ela ainda precisa do pai para neutralizar o poder da mãe, então ela busca um meio de conseguir que ele a acolha. Como ela se identifica com a mãe e percebe a relação de amor erótico que a mãe tem com o pai, ela passa a usar do poder de sedução para atrair e conseguir ser acolhida. É nesse ponto que acontece a troca do objeto de amor edipiano para a menina. No início ele também era a mãe, mas agora passa a ser o pai.
Durante essa fase os desejos são direcionados ao progenitor do sexo oposto, e a criança também se depara com o tabu do incesto, sentimento de culpa e vergonha muito grande.
Logo após, a criança entra no período de latência, que fica entre a fase fálica e a fase genital e dura aproximadamente dos 7 anos até a puberdade. Nesse período os impulsos e desejos sexuais incestuosos são recalcados, se tornam conteúdos inconscientes e em nenhum momento são lembrados.
A mãe é o primeiro objeto de amor e identificação tanto para o menino quanto para a menina. Aquela que cuida, protege, alimenta, mas que representa também um poder avassalador. E é nessa fase que a criança se depara com um conflito entre querer continuar tendo essa proteção e criar independência. O pai simboliza o mundo externo, aquele que sai, conhece o mundo e retorna.
A passagem do período de latência para a puberdade é marcada pela entrada na fase genital, a última fase do desenvolvimento psicossexual, que vai da puberdade em diante. Aqui a criança se depara com um novo conflito: “Não posso desejar quem amo, mas posso desejar um outro que não amo”. E ela tem a grande tarefa de fazer com que os impulsos sexuais entrem em harmonia com os impulsos carinhosos e o amor. Deverá encontrar uma maneira de se livrar do CE, direcionando seu desejo e atenção para um novo objeto de amor, livrando-se do desejo pelo progenitor. E para que essa transição seja bem sucedida é necessário que ela se relacione com outras pessoas e com o mundo externo.
Nesse período é preciso que pai e mãe sejam atenciosos porque o progenitor do sexo oposto ainda é o objeto de amor edipiano, visto como rival, e qualquer mensagem que faça parecer que o filho assumiu o lugar do pai ou a filha assumiu o lugar da mãe, o tornará um vitorioso edipiano ao invés de ajudá-lo a alcançar uma resolução sadia do CE. E um vitorioso edipiano possivelmente poderá vir a se tornar um adulto com dificuldades de se relacionar com pessoas do mesmo sexo e do sexo oposto.
Segundo Freud, a resolução pode ser positiva ou negativa. Na resolução positiva a criança se identifica com o progenitor do mesmo sexo e encerra a competição – A menina se identificará com a mãe, e buscará por alguém como o pai, e o menino se identificará com o pai e buscará por alguém como a mãe. Na resolução negativa, a criança abandonaria a competição e adotaria uma posição homossexual. Por exemplo, desejar o amor do pai e não ser correspondida da maneira fantasiada mais a percepção de que aquele amor continua sendo da mãe, poderia levar a menina a se sentir traída e passar a se afastar de todos os outros homens.
Dito tudo isso, vamos pensar em todo esse conflito inconsciente unido a uma possível superproteção materna ou paterna: ele/ela precisa direcionar o seu desejo e atenção para um outro objeto de amor, mas não enxerga possibilidades de fazê-lo porque de certa maneira se vê proibido de se relacionar com o mundo externo e/ou o sexo oposto. A criança sente culpa por desejar, caminha para a resolução do CE, mas recebe uma mensagem contrária. Se o pai ou a mãe a proíbem de se relacionar com o sexo oposto, por exemplo, e demonstram ciúme, ele/ela pode entender que é a menininha do papai ou o menininho da mamãe. Pronto, temos aí a mensagem tanto para o menino quanto para a menina de que venceram a competição com o progenitor do sexo oposto e tomaram o lugar do pai ou da mãe. Então a superproteção e consequentemente repressão, a levaria a uma resolução negativa do CE.
Apesar de Freud acreditar que dificilmente uma pessoa passa por essa fase ilesa, pois os conteúdos recalcados nesse período são muito fortes, uma resolução do CE sadio é o que dará mais chances de que a criança venha a se tornar um adulto com bons relacionamentos com o sexo oposto e com pessoas do mesmo sexo. Uma fixação durante a fase do CE em um dos progenitores pode trazer consequências desagradáveis, por exemplo, o adulto casar-se, mas não conseguir se relacionar de uma maneira saudável, pois inconscientemente crê que está traindo o pai ou a mãe. Os raros casos em que o indivíduo consegue uma resolução positiva, e emerge ileso, exige muito de pais extremamente sensíveis e saudáveis. Se isso acontecer, seus relacionamentos adultos têm grandes chances de serem saudáveis e livres de culpa e medo excessivos. E esses indivíduos serão capazes de passar para seus filhos e filhas uma criação com a mesma amabilidade com a qual foram criados.
Uma fixação durante a fase do CE em um dos progenitores pode trazer consequências desagradáveis, por exemplo, o adulto casar-se, mas não conseguir se relacionar de uma maneira saudável, pois inconscientemente crê que está traindo o pai ou a mãe.
BIBLIOGRAFIA
KAHN, MICHAEL. Freud Básico. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011. 59-122 p.

PERSONALIDADE O TEMPERAMENTO E O CARÁTER

Adriana C Mendes


Personalidade é um tema complexo. Conceituá-la de modo útil e compreensivo é uma difícil tarefa para os estudiosos do assunto. Sabemos que não há duas personalidades idênticas como não existem duas pessoas idênticas, embora muitas pessoas possuam traços em comum. A personalidade é temporal, pertence a uma pessoa que nasce, vive e morre. Personalidade é a resultante psicofísica da interação da hereditariedade com o meio.
O desenvolvimento da personalidade está intimamente associado ao desenvolvimento físico. Entretanto, as pessoas tendem dissociar o psíquico do físico, supervalorizando funções psíquicas como, por exemplo, a afetividade e subestimando funções físicas como, por exemplo, a excreção. Sabe-se, porém, que as primeiras motivações e ansiedades do ser humano estão ligadas aos processos fisiológicos.
Seja qual for a fase do desenvolvimento, a personalidade apoia-se na estrutura física do indivíduo, a qual chamamos constituição. Nesta há um conjunto de características individuais hereditárias que podem ou não se desenvolver nas interações com o meio. A este conjunto dá-se o nome de genótipo. Por outro lado, existem características individuais adquiridas basicamente por influência do meio e que no conjunto são chamadas de parátipo.
Entretanto, quando se observa uma pessoa, ela apresenta-se com sua estrutura fenotípica que é o resultado da integração genótipo- parátipo. Sem aprofundar o significado dos conceitos acima, por analogia, podemos relacionar, no plano psicológico, temperamento com genótipo, carácter com parátipo e personalidade com fenótipo.
Temperamento é a tendência herdada do indivíduo para reagir ao meio de maneira peculiar. Assim, desde o nascimento, entre os indivíduos verificam-se diferentes limiares de sensibilidade. Frente aos estímulos internos ou externos, diferenças no tom afetivo predominante, variações no ritmo, intensidade e periodicidade dos fenómenos neurovegetativos (que funciona involuntariamente ou inconscientemente).
Carácter é o conjunto de formas comportamentais mais elaboradas e determinadas pelas influências ambientais, sociais e culturais, que o indivíduo usa para adaptar-se ao meio.
Ao contrário do temperamento, o carácter é predominante volitivo (depende da vontade) e intencional. Entretanto, de modo geral, temperamento e carácter estão intimamente associados, podendo estar tão imbricados que se torna difícil sua distinção.
Portanto Personalidade é a interação dos aspectos físicos, temperamentais e características. A personalidade vem da palavra latina persona, que se refere à máscara utilizada pelos atores em uma peça de teatro. Nesse sentido, podemos perceber como persona se refere à aparência externa que mostramos a quem nos rodeia.
Se pensarmos um pouco, vamos perceber que de fato usamos algumas máscaras na nossa vida, ou seja, dependendo do momento e das pessoas que estão conosco, utilizamos máscaras diferentes. Imaginemo-nos em um parque de diversões com nossos primos; nossa tendência é brincar no maior número de brinquedos, rir bastante e lembrar  dos tempos da infância.
Agora, Imaginemo-nos no primeiro dia do estágio, aquele frio na barriga... tendemos a nos comportar da maneira mais formal e respeitosa possível, ou seja, bem diferente do primeiro exemplo, porque nós sabemos que no ambiente profissional as expectativas em relação ao nosso desempenho são referentes à nossa carreira profissional, enquanto no parque de diversões as expectativas são de lazer.
Mesmo compreendendo que a nossa personalidade diz respeito às características externas e visíveis, podemos questionar sobre as nossas atitudes mais íntimas, nossos pensamentos secretos, sonhos, desejos, fantasias, enfim nosso “eu” mais profundo e desconhecido pelos outros e até mesmo por nós mesmos. Com certeza, nossa personalidade também engloba tudo o que as outras pessoas não veem e nem nós conhecemos em alguns momentos. Por exemplo, já aconteceu de você ficar surpreso com algo que você fez e nunca imaginou ter coragem de fazer antes ou sequer pensava ser capaz de fazer, como uma declaração de amor em público.
Escolher um único conceito para personalidade não é suficiente para expressar o que de fato a compõe, pois muitos autores já tentaram definir essa palavra e o fizeram de diferentes maneiras. Existem teorias que se assemelham e outras que diferem em relação ao estudo da personalidade, mas independente da teoria escolhida, todas concordam que existem princípios que norteiam os mais diferentes conceitos de personalidade. A seguir, temos os princípios:
Princípio da globalidade: Personalidade é tudo que nós somos, ou seja, elementos inatos, adquiridos, orgânicos e sociais. Princípio social: Todas as pessoas necessitam de convívio social, ou melhor, interagir com outras pessoas. Mesmo as pessoas mais tímidas e reservadas sentem necessidade de contato interpessoal.
Princípio da dinamicidade: A personalidade organiza, integra e harmoniza todas as formas de comportamento e características do ser humano. Nossa vida é cheia de acontecimentos e a nossa personalidade tenta organizar isso da melhor maneira possível.
Princípio da individualidade: Cada um de nós é único no mundo. A personalidade é um conjunto total de características próprias do indivíduo, as quais  o diferencia das demais pessoas.
Com base nas consultas bibliográficas, concluímos que a personalidade é a resultante psicofísica da interação da hereditariedade com o meio, manifestada através do comportamento, cujas características são peculiares a cada pessoa. E que seja qual for a fase do desenvolvimento, a personalidade apoia-se na estrutura física do indivíduo, a qual chama-se constituição. Compreendemos também que a personalidade de um ser depende de vários fatores, entre os quais são mencionados a constituição, temperamento e o carácter.


FILHOS DO MEDO


Eliani Gracez

O ser humano encontrou no medo uma forma de organização social. Surge assim a cultura do medo. Impor limites, para alguns, é impor o medo. E assim, milhares e milhares de crianças foram educados pelo medo, para o medo e com medo. Crianças que cresceram limitadas, angustiadas, e, é claro, infelizes. Quando uma criança é educada com medo, ela se torna obediente e incapaz de impor sua vontade diante das relações desiguais. O medo assume uma representação marcante e limitadora da potencialidade humana. Por isso, a educação, historicamente, se deu através de castigos e agressão. E assim, ao longo dos séculos, o medo foi “o carro chefe” da educação. Como bons filhos do medo, tememos até mesmo a liberdade, pois o medo impõe um limite atroz, e por isso desconhecemos a liberdade. Medo de morrer, medo da velhice, medo da doença, medo de perder o que foi conquistado, medo de promover mudanças na vida, por isso preferimos a mesmice, medo do desconhecido. Medo de encarar um novo desafio e perder tudo. Medo de ter que começar tudo outra vez. Medo! Medo! Medo! Onde há o medo não pode haver sabedoria, dizia um filósofo antigo. Não sabemos mais viver sem medo e sem disseminar o medo. Seja através de uma chinelada no filho ou um olhar ameaçador. Tem até quem pense que só respeitamos aqueles a quem tememos. É por não saber fazer se respeitar de outra forma, que o ditador impõe o medo e alguns pais usam o chinelo. Quanta ausência de sabedoria! Tudo isso, porque ao invés de criar a cultura da felicidade e ensinar aos filhos a ter responsabilidade diante da vida, por falta de sabedoria, criamos a cultura do medo. E hoje, por mais que uma mudança no paradigma da educação seja necessária, tememos a mudança. Foram séculos e mais séculos de educação pelo medo. E com isso, a liberdade em pessoas despreparadas para ela, tomou caminhos tortuosos. Tudo isso porque a liberdade na cultura do medo foi afastada, extirpada como se fosse um grande mal. O desafio é grande, acabar com a cultura do medo é dar a todos os seres humanos a mesma condição de igualdade ou de liberdade com responsabilidade. Por isso hoje se fala em “rede” ou “teia” na área da educação na da família. Onde uma pessoa não é mais importante do que a outra. O problema é, quem é que sabe educar sem se impor através do medo? Onde estão nossos sábios? Ditadores poderíamos apontar um monte, mas sábios, quem conhece um?

sábado, 3 de agosto de 2019

TERAPIA DE CASAIS

Eliani Gracez

A procura pela terapia de casais tem aumentado muito nos últimos tempos. Não é fácil estabelecer um padrão de relacionamento, no entanto, é possível configurar uma estrutura sólida dentro da relação. Casais lgbt podem enfrentar as mesmas dificuldades de relacionamento que os casais heterossexuais enfrentam.  As pessoas esperam encontrar no outro uma maturidade emocional que atenda a sua carência afetiva, mas nem sempre isso acontece devido, por exemplo, aspectos como a realização profissional, desemprego, estresse etc. Ao nos aproximar de alguém a pergunta que podemos nos fazer é o que eu tenho para oferecer ao outro? Ou será que eu só quero receber?  Entre o dar e o receber reside um dos fatores do equilíbrio emocional de uma relação. Embora esse equilíbrio vá além das emoções. Somos condenados a investir! Investir em um vínculo com o outro, investir nos nossos sonhos, investir no nosso trabalho, e assim aprendemos com os investimentos que fazemos. Cada investimento é um novo aprendizado. E assim são as relações inter pessoais.

Uma mente que brilha

Eliani Gracez   Em virtude da negatividade do cérebro, é preciso um empenho ativo para interiorizar as experiências positivas e cicatrizar ...