Eliani Gracez- Psicanalista
Não
existe um ser universal, porquanto o ser é constituído por fatores existenciais
que formam combinações e transformações transitórias que, por sua vez, alteram
a cultura e levam pessoas para mudanças em uma espiral sem fim. Partindo de uma
visão holística, a criança não é mais o bebê, o adolescente não é mais a
criança, e o adulto de hoje não é o mesmo adulto do passado, tampouco será a
mesma pessoa no futuro. Em resumo, nós e o mundo que nos cerca estamos nos
transformando. O fato é que este mundo já não é mais o mesmo, esse
velho planeta cheira a novidade. A mulher mudou, a criança mudou. E os idosos
estão em um processo contrário, estão rejuvenescendo. Corremos, temos pressa,
somos impacientes, não conseguimos parar, queremos tudo agora. Não toleramos a mesmice, enfim,
queremos mudanças. A tecnologia tomou conta da vida. Computadores,
máquinas informatizadas, configurações unindo hardware e software, inúmeros
satélites rodeando o planeta. Segundo Zimerman, uma jovem estudante de medicina
na década de 60, em um grupo de terapia, levou aproximadamente um ano e meio,
com medo da culpa e do julgamento das demais pessoas do grupo, para confessar
que mantinha relações sexuais com seu namorado. A moral do passado não é a
mesma moral da atualidade. Hoje vivemos em um mundo interligado
onde os acontecimentos importantes têm repercussão quase que instantânea. Isso
requer uma visão sistêmica da vida e do mundo onde a maneira como as partes
estão integradas e estruturadas é mais importante do que o individualismo. A
forma como as pessoas estão integradas ao todo é mais importante do que cada
parte isolada. Em meio a tudo isso, novos padrões éticos precisam ser
analisados. A família nuclear passa por transformações radicais.
Casamentos seguidos de separações e novos casamentos, mudaram a configuração da
família. Para o psicanalista
Jean-Pierre Lebrun, o modelo tradicional de família tem sofrido modificações
significativas. O modelo do passado era de uma hierarquia, em forma de
pirâmide, onde os filhos deviam obediência aos pais. Esse modelo tornou-se
decadente e foi substituindo por um novo modelo onde o filho é tão respeitado
quanto o pai, e a mulher tem a mesma igualdade e os mesmos direitos que o
homem. Esse novo modelo não é bom nem ruim, ele é apenas diferente. O problema
é que esse novo modelo requer uma nova forma de educação. A nova criança é
ousada e não teme os pais e quer liberdade para fazer suas próprias escolhas.
Ela quer ser “dona do seu nariz”. Com isso os pais perderam a autoridade sobre
os filhos. A educação pela autoridade
deve ser substituída por um novo modelo rico em sabedoria, onde a criança
compreende sua importância no mundo e é preparada para exercer seu papel dentro
da sociedade. Essa nova criança surge como espelho à liberdade da mulher. A
submissão da mulher, no passado, também foi modelo para crianças que deram
continuidade ao patriarcado. Em meio a essa mudança toda, tem jovens que não
sabem o que fazer com sua liberdade, porque não foram preparados para enfrentar
o grande desafio que é viver e fazer escolhas. Se no passado os pais faziam
escolhas pelos filhos, hoje são os próprios filhos que fazem suas próprias
escolhas. Isso exige um preparo que muitos não têm. Exige que pais preparem
seus filhos para fazer escolhas com responsabilidade. Nesse novo paradigma
também é preciso ensinar aos filhos a lidar com a adversidade e com as falhas
humanas. Não somos perfeitos, vamos errar inevitavelmente mais cedo ou mais
tarde. Os pais de hoje procuram dar de tudo aos filhos e criam a ilusão de uma
vida sem erros. No passado, quando uma criança tirava notas baixas na escola,
ela sabia que teria de se justificar diante dos pais. Hoje, quando uma criança
vai mal na escola, os pais tratam como se a falha fosse do professor e não da
criança. No modelo atual, é o professor que tem que se justificar pelo baixo
rendimento do aluno, eximindo a criança do erro. O sonho de uma vida sem erros
e repleta de prazer, muitas vezes, acaba no consumo de drogas. Uma fuga às
dificuldades da vida que nem sempre é tão perfeita quanto a infância. Em meio a
toda essa mudança que o planeta passou, a moral teria necessariamente que ser
questionada, desse questionamento surge uma nova moral e um novo modelo de
homem, que não é mais o modelo da Grécia em seu período clássico, onde o homem
se oferecia aos deuses e cultuava o belo. Tão pouco é o modelo aristotélico do
homem virtuoso, muito menos é o modelo medieval onde a vida só valia a pena ser
vivida em Deus. A vida de hoje pede uma nova reflexão ética para dar origem a uma
nova moral.
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